sábado, 13 de dezembro de 2008

REVIEW - Within Temptation - Enter [1997] e The Dance EP [1998]

Tracklist:

1. Restless
2. Enter
3. Pearls of Light
4. Deep Within
5. Gatekeeper
6. Grace
7. Blooded
8. Candles





O acto de me sentar em frente ao ecrã do portátil a ouvir Enter dos Within Temptation (WT) tem, para mim, tudo de familiar e, simultaneamente, de estranho. As músicas são-me tudo menos desconhecidas, mas pensar e escrever objectivamente sobre elas já é uma coisa diferente. Nas milhares de vezes que ouvi este CD, muitos foram os motivos por detrás do acto de carregar no play e escolher uma ou outra faixa. Na base, o sentimento geral: os WT são, desde 2003, a minha banda de eleição. Esse foi, para mim, o ano de viragem em termos musicais. Ouvi pela primeira vez Ice Queen e fui esmagada pela obra-prima que é o álbum Mother Earth. Ainda antes do lançamento de The Silent Force, já tinha ido em busca das chamadas "raridades", entre as quais, este Enter e o EP The Dance. E o deslumbramento continuava – estas eram as músicas mais pesadas que já ouvira na minha vida.

Hoje, seis anos depois, esta afirmação está longe de ser verdadeira, mas o deslumbramento, esse jamais desapareceu ou diminuiu, ou não fossem estes Enter e The Dance dois registos admiráveis. As razões para ouvir a música dos WT passaram a ser diversas e a consciência do acto de carregar no play tornou-se cada vez mais inconsciente. Se queria peso e escuridão, Enter ou The Dance davam-me isso mesmo; ou porque não Gatekeeper, Another Day ou Grace. Se queria suavidade e beleza, a lembrar tempos celtas, tinha a sempre bela Pearls of Light. Ou a fenomenal Candles. Se queria a pureza de uma balada, tinha Restless. Se desejasse velocidade e peso, lá estava The Other Half (of Me). E se qualquer uma destas razões não servisse, havia sempre a saudade do som dos WT nos seus primórdios. Quem os acompanha desde esta altura, ou mesmo antes, sabe do que estou a falar. A produção não é de excelência, os grunts de Robert Westerholt não são os melhores que já ouvimos, a voz de Sharon den Adel não apresenta a qualidade cuidada de hoje. Mas tudo isto não poderia soar melhor aos meus ouvidos.

Enter é o álbum de estreia dos holandeses WT e data dos finais dos anos 90, mais precisamente de 1997. Por esta altura, Robert Westerholt abandonava o seu anterior projecto, os Voyage, e encontrava nos WT a possibilidade de criar a música que sempre tinha desejado ouvir – o peso do metal aliado à melodia da música clássica. E encontrava também, na companheira Sharon den Adel, a voz perfeita para a sua música. À fundação de base juntaram-se Jeroen van Veen (no baixo), Martijn Westerholt nos teclados, o segundo guitarrista Michiel Papenhoeve e Ivar de Graaf na bateria. Estes últimos três abandonaram a formação e foram substituídos, em 2001, pelos músicos actuais. Até aqui nada de novo - uma pesquisa no Google esclarece o ouvinte mais interessado. Se esse ouvinte for à procura do álbum de estreia, motivado pelo último registo do colectivo, provavelmente pensará que está perante uma outra banda. Os WT de 1997 tinham pouco a ver com os WT de hoje, e isto não é uma afirmação de saudosismo dos tempos passados. Não. É uma constatação. Também não quero dizer que perderam qualidade, que “os velhos tempos é que eram”. Não. Os WT actuais estão no topo da sua carreira e, por sinal, de muito boa saúde. E recomendam-se.

Enter é diferente do que fazem hoje em muitos aspectos menos num – é um registo de metal sinfónico/melódico. E digo metal, mesmo, sem ambiguidades, sem qualquer pontada do seu rock actual. Estou a falar de metal lento, pesado e repleto de melodia. Metal gótico, doom, com apontamentos de black metal. Em Enter, a grande maioria dos temas são mais longos do que aquilo a que os WT nos têm vindo a habituar recentemente, o que revela a toada doom bem acentuada deste registo. Mas em 1997, a sonoridade dos WT tinha já aquilo que ainda hoje fascina e é praticamente inigualável – melodias de piano majestosas e envolventes, guitarras harmoniosas e com o peso necessário, uma bateria presente nos momentos certos e um sentido apurado daquilo que procuram musicalmente.

Logo no seu álbum de estreia encontramos alguns dos melhores temas do colectivo holandês. A fórmula musical de Enter - a dualidade Beauty and the Beast - parece gasta nos dias que correm, mas na época era do mais fresco que havia e os WT eram [e ainda são] muito bons no que faziam, sabendo marcar a diferença e começando, já nesta altura, a construir uma sonoridade coesa e inconfundível.

A faixa de abertura do álbum, Restless, é uma das baladas mais marcantes da carreira dos WT. A melodia do piano já se tornou uma preciosidade para os fãs da banda, assim como o ritmo lento e cadenciado. A voz soprano de Sharon den Adel demonstra toda a sua juventude e força – uma voz bela e quente, capaz de atingir oitavas de respeito. Guitarras lentas e dramáticas juntam-se à melodia do piano e a voz de Sharon eleva-se acima desta paisagem de pura beleza. Estavam lançadas as bases para uma sonoridade teatral, no bom sentido do termo. Mas Restless era apenas uma amostra de todo o potencial da banda.

A faixa-título, essa, é mesmo de arrepiar. Não será preciso descrever o som do portão que se abre, a voz masculina que diz: “Welcome to my home” e uma súbita bateria que faz a primeira das suas aparições de imponência A melodia que se segue é uma das mais memoráveis e poderosas que já tive a oportunidade de ouvir [e mesmo que os gostos não se discutam, acho que neste ponto, pelo menos, posso fazer-vos concordar comigo, certo?]. Os teclados são hipnotizantes e o ritmo encantatório. Os WT convidam-nos a entrar no seu mundo e este não poderia parecer-nos mais fascinante. As guitarras recriam a melodia dos teclados e a música sobrepõe-se em camadas, por debaixo dos guturais de Robert. Guturais que nunca tiveram muito peso na música dos WT, mas que eram algo novo e fresco em 1997 - época de glória do esquema Beauty and The Beast, que os WT tão bem souberam adaptar à sua sonoridade. Na faixa Enter, os guturais fazem o contraponto com o tom mais feérico de Sharon, numa música cujo formato não é de todo convencional. O refrão acaba por ser o momento mais suave de toda a composição, com sintetizadores subtis e Sharon cantando em tom melancólico, até nova aparição dos grunts e mergulho na melodia hipnótica. Conclusão: Enter é uma faixa obrigatória para qualquer apreciador de metal sinfónico e melódico [eu diria mesmo para qualquer apreciador de metal], uma pérola de peso e harmonia. Incontornável.

A suavidade de Pearls of Light mostra-nos o outro lado dos Within Temptation, que já se deixava entrever em Restless. O colectivo holandês é mestre na melodia e esta faixa é um exemplo disso mesmo. Sintetizadores e teclados fantasiosos, até à chegada das guitarras e bateria, naquele que é mais um refrão de qualidades líricas notáveis. Sharon utiliza, a um dado momento, o seu timbre mais lírico, que contribui para acentuar o encantamento em que este tema envolve o ouvinte.

Em Deep Within mergulhamos na veia black metal melódico dos WT. Vocais entregues a George Oosthoek – na época, vocalista dos já extintos Orphanage – e total ausência da voz de Sharon. Refrão vibrante, mais uma melodia hipnótica, acelerações breves intercaladas com ritmos mais compassados. Os WT provam que nem sequer precisam de uma voz melodiosa para serem melódicos.

Gatekeeper é uma faixa maioritariamente instrumental, com uma estrutura complexa que hoje seria impensável num trabalho dos WT [ainda assim, uma inspiraçãozinha nesta Gatekeeper num álbum futuro e eu não me queixava]. Esta é a faixa por excelência da conjugação das melodias dos teclados com o peso das guitarras. Inspiração lírica negra e opressiva, muito bem interpretada por Sharon.

Grace continua na mesma linha, embora com maior participação vocal. O refrão não nos cativa à primeira, mas após algumas audições, lá fica por uns tempos. O destaque vai para… a melodia, claro. Esta faixa, em todo o seu peso de verdadeiro metal, embala-nos e transporta-nos para longe. A voz de Sharon assume perfeitamente as suas duas vertentes - o seu carácter mais etéreo e encantatório e o seu lado mais tenebroso e vibrante. Uma ambiguidade em que se especializará nos anos seguintes e na qual ninguém, até hoje, a conseguiu igualar. Segue-se Blooded, um somatório interessante do que a banda fazia na época a nível instrumental.

Enter termina com aquele que é um dos melhores temas de sempre dos WT. Falo de Candles, que é tudo aquilo que, na minha humilde opinião, faz dos WT os WT e não outra banda qualquer. E embora a descrição de uma música, seja ela qual for, fique sempre aquém da música em questão, aqui vai uma tentativa. Suavidade. Sharon e o seu timbre mais etéreo. Este é apenas o mote, porque o que se segue é uma ambiência de obscuridade, mistério e peso. Estamos perante um trabalho lírico de grande beleza e uma composição musical e instrumental mágica. Após o manto tecido pelos sintetizadores, entra um piano sóbrio. E depois aquela bateria e aquelas guitarras. As adequadas. O tom etéreo de Sharon torna-se inatingível, até os grunts de Robert nos fazerem descer à terra, deitando-se sobre a melodia viciante do piano. Tudo se combina numa quase perfeição. E só não digo perfeição, porque tive a oportunidade de ouvir, mais recentemente, uma interpretação deste tema ao vivo e, essa sim, foi perfeita, porque juntou a qualidade e profissionalismo dos WT de hoje à magia do que faziam em 1997.



Tracklist:
1. The Dance
2. Another Day
3. The Other Half (of Me)












Um ano depois, a banda lançava o primeiro (e único) EP da sua carreira. The Dance apresentava três novos temas. No que respeita aos teclados, o som do piano deixa de ter tanta presença e investe-se mais no som característico do órgão propriamente dito, tornando a sonoridade mais pesada e obscura. Tratava-se de mais um passo na direcção de Mother Earth.

A faixa título, The Dance, só é equiparável à própria Enter em peso e força. Absoluto predomínio do órgão que discorre uma melodia perturbadora, mas ainda mais perturbador é o tom que Sharon utiliza. A sua voz soa absolutamente malévola, naquela que é a faceta que mais gosto no seu timbre e que será mais profundamente explorada no álbum seguinte. O diálogo Beauty and The Beast marca presença, assim como uma bateria mais variada e rápida, que sossega no já característico momento lento e dramático.

Another Day é uma faixa pesada e teatral, com teclados, coros sintetizados e guitarras arrastando uma melodia dolorosa. A voz de Sharon paira algures entre o céu e a terra, crescendo em intensidade até se tornar soberana de toda a composição.

Ainda neste EP, a banda traz-nos uma das suas melhores malhas sonoras – The Other Half (of Me) é capaz de ser tudo o que um metaleiro mais tradicional pode desejar de uma banda de metal sinfónico. Este tema é veloz – mais veloz do que qualquer coisa que os WT haviam feito até esta altura – e, ainda hoje, é um dos temas mais rápidos do seu repertório. A melodia vertiginosa que abre este faixa é conhecida de qualquer fã. A velocidade das guitarras imprime uma força única a esta faixa, que é a incorporação mais que perfeita do formato Beauty and The Beast - o diálogo entre Luz e Sombra, Bem e Mal, a Bela e o Monstro, desenrola-se por entre a fúria das guitarras e da secção rítmica.

Enter não é o melhor álbum dos WT. Não é o melhor a nível de produção nem a nível instrumental [e só não digo o mesmo em relação às letras, porque tenho por estas uma estranha mas profunda afeição]. Ainda assim, é a estreia brilhante dos WT. Neste álbum, e no próprio EP, encontram-se algumas das melhores composições do colectivo. E também está aqui a receita daquilo que fazem hoje – uma melodia inspirada, pensada e construída para se entrelaçar com o peso do metal, uma bateria já nesta altura bem característica e uma estrutura lírica que se reveste de um carácter poético. É também nestes dois registos que podemos escutar o grito de uma voz excepcional, que cresceu em domínio e beleza, tornando-se numa das melhores vozes femininas do metal.

Destaques:
Restless, Enter, Candles, The Dance, The Other Half (of me)


16.8 valores em 20

Inês Martins (Lua Minguante)

3 comentários:

Anónimo disse...

Só tenho uma coisa a dizer sobre o vosso review: ADOREI!!!!!

Menias, vocês deviam levar isto mais a sério. Deixo-vos uma sugestão: Internacionalizem o vosso blog! Nunca vi ninguém escrever como vocês.

Parabéns!!!

__Bárbara__ do forum de WT

Senhora do Metal disse...

Muitíssimo obrigada Bárbara! Fico imensamente feliz que aches isso:) Muito obrigada pelas tuas palavras e por teres lido!

Gostava de te pedir que mandasses a tua sugestão para o e-mail, se souberes como podemos melhorar o blog:) agradecia imenso:) o mail é senhorasdometal@gmail.com

Obrigada mais uma vez,

Inês Martins (Lua Minguante)

Anónimo disse...

Ora, primeiro a minha opinião sobre este Review: ADOREI-O! Ao lê-lo passeamos pelo mundo da música dos WT. Mesmo para quem não os conheça fica com uma profunda ideia do sentimento que a música de Enter e The Dance[EP].

Sentimento o qual partilho contigo. Já não ouvia Enter há um tempo, mas devo confessar que sempre que o vou buscar à minha estante para o por na minha aparelhagem (ou PC) é por sinto falta da escuridão de outros tempos, de outras vidas... Saudades dos temas melódicos, mas pesados, que estes dois cd's trazem consigo. As músicas, cada qual com a sua história, conseguem-nos envolver de tal modo que nos tornamos parte dela. Arrepios, misto de demónios e anjos. Um teatro como não há igual. Um toque da Natureza misturado com a grandeza da orquestra, com o poder da Voz de Sharon. Ouve-se, interessa-se, adora-se... Repete-se.


Ricky The Shadow Of Sorrows