domingo, 15 de junho de 2008

LIV KRISTINE - A Voz

O ano de 1995 foi um ano de viragem para o metal no feminino: foi o ano em que os Theatre of Tragedy, na época uma obscura banda de Doom Metal, lançaram o seu primeiro álbum. O self-titled combinava guturais com uma bela voz soprano o que – embora hoje seja comum até à exaustão – na época era uma ideia inovadora.

Os TOT não foram os primeiros. Na primeira metade dos anos 90, os Paradise Lost já tinha feito algumas experiências no estilo que, mais tarde, seria denominado Beauty & and the Beast. No entanto, os TOT têm o mérito de terem sido os primeiros a fazê-lo de forma ostensiva, e a terem uma soprano a tempo inteiro, como parte da formação da banda.

Liv Kristine era, então, uma jovem desconhecida. Em Theatre of Tragedy, a fraca produção não permitiu que a sua voz brilhasse, à excepção da faixa ... A Distance There is..., em que a voz etérea de Liv é apenas acompanhada por um delicado piano e pelo som da chuva a cair. Esta é, na minha opinião, e apesar da sua simplicidade, a melhor faixa do disco, e uma das melhores composições da carreira da banda norueguesa.

TOT


Mas foi em 1997 que os TOT lançaram o álbum que mudaria a sua carreira de forma determinante: Velvet Darkness They Fear. Se o primeiro álbum se destacou pela novidade, neste segundo trabalho atingiram a mestria no estilo no qual foram os precursores. Obtiveram excelentes reviews e alguma atenção, a qual confluiu na voz e imagem de Liv Kristine, que se tornou a rosto da banda e um ícone do female fronted metal.

Para o ouvinte de 2008, Velvet Darkness They Fear não apresenta nada de novo, mas para o ouvinte de 1997 representou algo diferente e exótico, especialmente numa época em que a participação das mulheres em bandas de metal era escassa. A partir daqui, muitas foram as bandas que seguiram as pisadas dos TOT. Estamos a falar de formações como os Tristania, os Within Temptation, os Sirenia ou os The Sins of Thy Beloved, entre muitas outras, que utilizaram o mesmo contraste entre grunts e vozes femininas angelicais, com grande sucesso, embora muitas tenham acabado por abandonar o estilo em trabalhos posteriores. As Senhoras do Metal que fazem, ou fizeram, parte destas bandas tornaram-se, elas próprias, ícones. No entanto, Liv Kristine foi a pioneira.

Estes primeiros álbuns dos TOT têm um som essencialmente sóbrio. Não esperem grandes riffs, baterias rápidas, ou algo de muito original em termos de composição. O ritmo é lento e cadenciado, as faixas não são muito diferentes umas das outras, e os instrumentos estão presentes para criarem certa uma ambiência de mistério e obscuridade. O ênfase vai todo para as vozes, para os diálogos teatrais, em inglês antigo, entre Liv e Raymond.

A voz frágil de Liv contrasta com os guturais apaixonados de Raymod, soando fria e etérea, como se não estivesse realmente presente – ela é a mulher inacessível, a Laura de Petrarca; mas outras vezes, a sua voz soa quase infantil, com um ligeiro toque de malevolência. Nestes primeiros lançamentos, Liv não incorre em grandes voos vocais e denota ainda alguma insegurança e inexperiência. No entanto, a sua voz pura e cristalina destaca-se pela sua grande beleza, tornando estes álbuns verdadeiramente poderosos, apesar da sua sobriedade.

Destaques para ... a Distance There is..., Sweet Art Thou, And When He Falleth, Der Tanz der Schatten e On Whom the Moon Doth Shine.

Photobucket


Após o lançamento do EP A Rose For The Dead, os TOT abandonam o estilo que os tornou famosos. Em Aégis já não se ouvem grunts e o Doom Metal passa a fazer parte do passado. Este terceiro álbum de longa duração é pautado por sonoridades entre o Gothic Rock, o Metal, com umas pitadas de New Age. Dedicado à figura feminina, os títulos das faixas correspondem a nomes de mulheres reais ou mitológicas. Aqui a voz de Liv torna-se mais suave, e os grunts desaparecem quase completamente, substituídos pelas vocalizações limpas de Raymond, que não são tão poderosas como eram o seus guturais. No entanto, Aégis é o álbum mais original da carreira dos TOT, com composições de grande beleza, onde a voz de Liv se eleva a um novo patamar, sobretudo na faixa Siren.

Em 2000 dá-se uma nova viragem: os TOT abandonam as sonoridades metálicas e experimentam um som mais electrónico. Musique e Assembly não são bem recebido pelos fãs, e recebem críticas arrasadoras. Porém, estes dois álbuns podem ser interessantes para quem tenha uma mente aberta e seja apreciador de industrial com uns laivos pop. Experimentem as faixas: Machine, Fragment, Image, Automatic Lover, Let You Down e Starlit.

Em 2003, Liv Kristine deixa os TOT e, logo no ano seguinte, lança Lovelorn, o primeiro trabalho da sua nova banda: os Leaves Eyes, da qual faz parte os membros dos Atrocity, entre os quais o seu marido, Alexander Krull. O nome Leaves Eyes foi imaginado pelo próprio Alexander, que se inspirou nos olhos de Liv.

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Em Leaves Eyes, Liv está no seu melhor. A sua voz torna-se mais forte, variando entre incursões líricas poderosas e vocalizações doces e luxuriantes, e outras ainda mais estéreas. Para além de emprestar a sua voz ao projecto, Liv toma também parte da composição, sobretudo nas letras, tendo criado os conceitos para os dois álbuns – tanto Lovelorn como posterior Vinland Saga são álbuns conceptuais, que tratam das lendas e tradições escandinavas. Em Leaves Eyes, voltamos a ouvir a voz de Liv a contrastar com grunts poderosos, desta vez de Alexander Krull.
As faixas que considero mais representativas desta fase de Liv são: Oceans’s Way, Lovelorn, The Dream, Farewell Pround Men, Elegy e Solemn Sea.

Para além da sua carreira nos TOT e nos Leaves Eyes, Liv Kristine também tem a sua carreira paralela, a solo. Entre 1998 e 2006 lançou dois álbuns. O primeiro, Deus ex Machina mistura o pop com sons mais electrónicos, passando também pelo New Age. O segundo, Enter My Religion, representa um salto qualitativo em termos de produção e composição e, embora seja um álbum de música pop, é mais coeso do que o anterior, e tem bastante para oferecer aos fãs da vocalista, uma vez que Liv tem mais espaço para explorar as várias facetas da sua voz, numa abordagem mais pessoal e intimista.

LIV


Finalmente, há que destacar as participações especiais de Liv Kristine em outras bandas, especialmente nos Atrocity, a banda do seu marido, nos Cradle of Filth e nos Delain.

Liv Kristine tem uma voz doce e suave, e não uma voz impositiva como a de outras grandes senhores do Metal. No entanto, na sua já relativamente longa carreira, Liv já experimentou vários estilos musicais, desde o Doom Metal ao pop, passando pela música electrónica, o que prova a sua grande versatilidade. Em 2008 continuaremos a falar dela, uma vez que aguardarmos o lançamento de um DVD ao vivo e, talvez, um novo álbum dos Leaves Eyes.

Cláudia Rocha - Quarto Crescente


Despedimo-nos da nossa primeira grande Senhora do Metal do mês com um vídeo de uma grande prestação de Liv nos TOT. Enjoy!

2 comentários:

Senhora do Metal disse...

adorei! um optimo final de mês com esta revisão da bonita carreira da nossa Liv ^^

Inês, Lua Minguante

Anónimo disse...

Viva!
Bom "sumário" da menina do mês! Gosto da Liv, acho que a voz dela é diferente, suave misturando-se com as melodias.

Abraço.